Chegando o Carnaval... Mas
antes que ele chegue para nos banharmos em alegria passageira, muita coisa está
acontecendo por aí, e não são nada agradáveis – pelo menos para aqueles que se
identificam com os oprimidos.
O revolucionário argentino
Ernesto Che Guevara chegou a dizer: “se você treme de indignação perante uma
injustiça no mundo, então somos companheiros!” Ah se somos! Não consigo ver
injustiças e fingir que nada está acontecendo. Não apenas tremo de indignação, mas fico triste não somente com os fatos em
si, mas também como um ser humano é capaz de justificar atos tão cruéis e
desumanos. O fato em questão é a reintegração de posse da comunidade
Pinheirinho em São José dos Campos, São Paulo. Não somente, ainda em São Paulo,
no bairro da Luz a famosa “cracolândia” foi dissipada não pelo intensivo
trabalho de saúde pública, mas de (in)segurança pública. Os governos municipais
e estaduais recuperam (sem falar explicitamente, mas as intervenções dizem por
si mesmas) a máxima de “questão social é caso de polícia”. No caso Pinheirinho,
a preocupação maior é com um “empresário-trambiqueiro” (com o perdão do
pleonasmo) que quase faliu até a Bolsa de Valores do RJ. Em vez de se preocupar
com as inúmeras famílias ali instaladas e buscar uma saída da maneira coerente,
opta-se por remover aquela população sem ao menos ter uma solução já pronta. Não
foi diferente no caso “cracolândia”.
Se a primazia da repressão
policial se resumisse as gestões do PSDB, seria algo compreensível por se
tratar de um partido destacadamente antipopular. Em Pernambuco o Governo de
Eduardo Campos (do PSB) reprimiu violentamente as manifestações contra o
aumento das tarifas de ônibus metropolitano. Se uma pessoa hipoteticamente tivesse
entrado em coma na década de 60 do século passado e acordasse agora em janeiro
de 2012 simplesmente se perguntaria: como assim? Para refrescar a memória política
(que no Brasil é algo quase que obsoleto, propositalmente) o Partido Socialista
Brasileiro (PSB) contribuiu para a organização das lutas camponesas, principalmente
através de Francisco Julião, que ousava bradar “reforma agrária na lei ou na
marra!”. A burguesia se arrepiava com a firmeza política das Ligas Camponesas.
Portanto, é algo bizarro crer que esse mesmo partido se degenerou a tal ponto que
não foi suficiente se dissolver na ordem, mas para piorar, a linha política do
PSB hoje é algo tão firme quanto castelos de areia em pleno vendaval. O PSB nos
tempos atuais dialoga com figuras do calibre de Aécio Neves (PSDB), Inocêncio
Oliveira (PR), Severino Cavalcanti (PP), e Paulo Skaf (hoje PMDB, há poucos
anos atrás PSB), presidente da FIESP.
Creio que nossa pátria mãe
continua tão distraída que ainda não percebeu que permanece sendo subtraída em
tenebrosas transações, a miopia talvez se deva ao fato de que antes eram os
setores mais conservadores da sociedade, atualmente são os “democrático-populares”
que a enganam.
Mas não precisamos nos
preocupar com nada disso, afinal, não mudaremos o mundo, tampouco acabaremos
com as injustiças sociais, muito menos revogar um aumento de passagem. Se assim
caminha a humanidade, para a total descrença nas ações políticas, a herança que
deixaremos é de um caminho cada vez mais solidificado para um mundo sob a completa
barbárie. E se de nada adianta fazer algo para transformar a realidade,
vibremos com os gols de nossos clubes de futebol queridos e esperemos
ansiosamente para os quatro dias do ano mais aguardados. Enquanto isso o povo
brinca com confetes e serpentinas ao som do frevo, maracatu, samba e muito
mais. “E um dia, afinal, tinham o direito a uma alegria fugaz, uma ofegante
epidemia que se chamava o carnaval” (Chico Buarque - Vai passar). Carnaval, carnaval! Nesse país “mulato
inzoneiro” carnaval é produto que comercializamos bem. Mas não se esqueçam que
esse carnaval nem é tão democrático assim: “apesar de ter criado o toque do
agogô fica de fora dos cordões do carnaval de salvador” (Natiruts – Palmares 1999).
Se não entendeu a imagem a seguir ilustra bem.
Clique na imagem para ampliar. |
Pernambucanos irão logo retrucar
afirmando que nosso carnaval, esse sim, é verdadeiramente democrático. Mas se
esquecem que aqui também existem camarotes (principalmente no Bloco Galo da
Madrugada). Tudo bem, aceito a ideia de que o carnaval de Pernambuco é o mais
próximo possível do que se espera de uma festa democrática, até porque numa
sociedade de classes não era de se esperar outra coisa, senão a separação entre
as classes. (para uma análise desmistificadora do carnaval de Pernambuco clique aqui)
Para concluir essa crônica,
que já se alongou além do que eu gostaria: os barões continuam famintos, e o
carnaval permanece nos sedando por pelo menos quatro dias. Só não quero me
enganar que as mudanças são impossíveis. Além de possíveis elas são necessárias.
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